Cada vez mais presentes nas organizações, as estratégias de cloud híbrida e de multicloud já não são apenas um nice to have para a maioria das organizações, mas sim um imperativo de negócio. Logicalis, Noesis e Red Hat partilham a sua visão sobre os mercados de cloud híbrida e multicloud
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A cloud híbrida e a multicloud deixaram de ser opções de nicho para se tornarem em estratégias dominantes nas infraestruturas empresariais. Entre a teoria e a prática existem desafios que têm de ser endereçados: custos operacionais que explodem, complexidade de gestão subestimada e promessas de portabilidade que raramente se concretizam. Numa mesa-redonda híbrida – com uma sessão em direto a partir do Fórum Tecnológico Lispolis, em Lisboa – especialistas da Logicalis, da Noesis e da Red Hat partilharam a sua visão de como evoluem os mercados de cloud híbrida e multicloud. O Data Act promete acabar com o bloqueio de fornecedor e garantir portabilidade técnica real. Na prática, o que é que isto muda nas estratégias de cloud das empresas portuguesas? Rodrigo Barone, Azure Sales Engineer, Logicalis: “À data de hoje, temos percebido esse movimento da portabilidade e a nossa visão é que a portabilidade não é tão simples quanto, por exemplo, a portabilidade do telemóvel. A portabilidade tem de se iniciar no design da arquitetura. Não é apenas a componente de sistema, mas também o quanto custa sair dali. Temos de levar em consideração questões regulamentares e o design vai facilitar essa portabilidade; se pensarmos desde o início no desenho da portabilidade, vai tornar-se mais fácil” Hugo Silva, Head of Cloud, Datacenter & Automation, Noesis: “O objetivo do Data Act é facilitar as transições, as portabilidades entre diferentes fornecedores. O objetivo é atacar os contratos e o lock-in que existem atualmente. Hoje, pensar numa mudança de um fornecedor de cloud pública tem custos muito elevados. As empresas vão ter mais poder; hoje têm muito mais dificuldade em fazer essas mudanças e ter a opção de fazer alterações como, por exemplo, fazemos de fornecedor de telecomunicações” As empresas portuguesas estão preparadas para exigir e validar a portabilidade técnica prometida pelos fornecedores? Edgar Ivo, Portugal Sales Account Manager, Red Hat: “Acompanho este movimento para cloud há vários anos e cerca de 30% tem uma maturidade de cloud elevada; a maioria não está nessa fase. É preciso ser mais ágil na cloud e retirar o melhor de cada um dos fornecedores. Há empresas que acreditam que a cloud não é o caminho, mas podem começar a fazer a sua jornada localmente e, por vezes, acabam por perceber que, aquilo que é virado para o cliente, pode estar a 100% na cloud” A regulação exige rastreabilidade, redundância e auditabilidade. Que mudanças está a gerar no desenho de infraestruturas híbridas?
Hugo Silva, Noesis: “Há alterações profundas. Têm existido muitas regulamentações e diretrizes no espaço europeu que pode ser visto como mais positivo ou mais negativo. Podemos ficar atrás de outras economias – como os Estados Unidos ou a China –, mas temos muito mais segurança sobre os dados. Hoje, há muito mais preocupação com a rastreabilidade no setor financeiro, por exemplo, de ver ponto a ponto tudo o que tenho. Hoje, existe uma maior preocupação em adotar nativamente soluções que permitem ter essa visibilidade” Com a Inteligência Artificial (IA) generativa, o custo de cloud deixou de ser técnico para passar a ser parte da mecânica financeira do negócio. Como é que as empresas devem repensar o FinOps neste novo contexto? Hugo Silva, Noesis: “A mudança de prática de FinOps está mais associada à infraestrutura e é preciso que as empresas vejam isso como uma vantagem, assumindo isso na sua génese para fazer parte da decisão. Neste movimento que está a acontecer, é preciso definir um framework estratégico baseado em informação, otimização e operação. É preciso que as equipas de desenvolvimento tenham visibilidade dos custos associados para terem perceção do custo real da solução” Rodrigo Barone, Logicalis: “FinOps não é o reporte no final do mês. É o trabalho diário com a visão financeira sobre esses consumos, não é chegar ao final do mês e analisar uma fatura. O FinOps tem de ser um trabalho proativo para que os casos de uso que utilizam inteligência artificial sejam efetivamente rentáveis. É o FinOps que vai dar essa confirmação de que determinado caso de uso vale a pena de ter a IA” Como evolui o FinOps num contexto de IA generativa? Continuamos a otimizar instâncias ou já estamos a calcular o custo de cada decisão de produto? Hugo Silva, Noesis: “Acredito que determinados segmentos já estão a olhar para isso, mas há uma dificuldade em ter boa informação para alimentar as ferramentas de FinOps: onde estão os dados, quanto estou a gastar efetivamente e alimentar essas ferramentas de FinOps. Esse é um dos pontos fundamentais. Até há bem pouco tempo falávamos de otimização da infraestrutura; hoje falamos de otimização de unidades de custo, de tokens” A observabilidade tornou-se o novo perímetro da segurança. Como é que as organizações podem construir visibilidade real num ambiente híbrido e multicloud?
Rodrigo Barone, Logicalis: “O grande desafio é conhecer para depois se observar; não se protege o que não se conhece. Conhecer a arquitetura e todo o desenho, conhecer todas essas componentes e o serviço que está a ser entregue para, aí sim, se observar tudo, como por exemplo a experiência do utilizador. Ao termos essa observabilidade, conseguimos colocar as ferramentas para proteger” A automação, como AIOps, SecOPS, SIEM/SOAR, está a acompanhar a complexidade das infraestruturas híbridas ou ainda é um ponto fraco? Edgar Ivo, Red Hat: “Pode dar uma automação da infraestrutura, mas não daquilo que é a nossa realidade. A automação tem de ser encarada como algo transversal, mas é preciso que as operações estejam integradas. O que tenho visto nas empresas com maior maturidade é a criação de centros de excelência de cloud – mas ainda são exceções. As automações ainda são vistas como pontuais, o que tira uma miríade de possibilidades à organização. No lado financeiro, estão a olhar para esta automação como uma resposta às regulamentações, como o DORA” Hugo Silva, Noesis: “Há consciência de que é necessário, mas depois há dificuldades para colocar isso em prática. Há um ponto importante que dificulta a automação que é a falta de processos ou a documentação desses processos porque está na cabeça de uma só pessoa. Se esse processo estiver documentado, claro que pode ser automatizado. Há um problema de processos, e esses processos têm de existir na génese, na criação das arquiteturas. Com as soluções complexas de hoje – multicloud e cloud híbrida, por exemplo – tudo vai ficar complicado se não existirem processos” Rodrigo Barone, Logicalis: “Em termos de tecnologia, a automação já existe há muitos anos e é madura. Os processos e as competências são essenciais. Temos muita tecnologia há muitos anos. Conhecer os processos, identificar os processos e perceber o que queremos identificar, e depois ter as pessoas com os conhecimentos corretos para colocar esses processos em prática, é essencial para as organizações. Se os processos não estiverem identificados, a automação tem a capacidade de causar mais entropia do que ajuda” As empresas portuguesas já têm modelos operacionais alinhados com ambientes híbridos e multicloud ou ainda funcionam em silos? Hugo Silva, Noesis: “O setor financeiro tem tido essa adesão a modelos mais transversais. Há organizações que têm equipas de cloud, mas dentro dessa equipa existe a parte de cloud privada, cloud pública e FinOps. Mas esta é uma exceção e há muitas empresas que ainda trabalham em silos. Acho que temos de avaliar o nível de maturidade em três pontos: tecnologia, que já existe disponível no nosso mercado; processos, para deixarem de existirem estes silos transversais; e pessoas, porque também é uma questão cultural”
Edgar Ivo, Red Hat: “Há diferentes realidades ao dia de hoje. Vemos um setor público muito em silos, muito tradicionais e com dificuldades em impor uma cultura diferente. Depois, vejo empresas que do ponto de vista de cloud sim, são transversais, mas depois a parte de desenvolvimento já está mais fechada, mesmo que não tanto quanto antes. Esta é a realidade com que mais nos deparamos. Se não existe esta capacidade de trabalho colaborativo, perde-se muito daquilo que são os benefícios destas soluções” Rodrigo Barone, Logicalis: “A grande maioria das empresas portuguesas trabalham em silos, é o departamento de cloud, o de networking, o de data center… o relacionamento e a comunicação não funcionam bem, de todo. As empresas olham para a cloud como um produto e não como um modelo ou habilitador do negócio. As empresas não trabalham com o catálogo de serviços. É preciso uma visão do topo para transformar esta cultura e quebrar os silos” O que é que a regulação está a obrigar a mudar na cultura operacional: reporting, documentação, responsabilização? Edgar Ivo, Red Hat: “Isto está a ter um impacto muito interessante, principalmente pela parte da responsabilização. Quando a responsabilização está ao mais alto nível, a preocupação com os processos, as evidências, a documentação… tudo muda. Isso ajuda a que estas questões sejam dispersas por toda a organização e que a própria organização se sinta responsável por isso. As organizações têm de impor as regras, mas também que conseguem ver ao detalhe qualquer eventualidade que tenha acontecido” Que competências humanas são mais críticas para uma organização atingir maturidade cloud entre 2025 e 2027? Rodrigo Barone, Logicalis: “Na parte mais tecnológica, as competências de automação são competências que já são muito exigidas. Além da parte tecnológica, as soft skills são importantes. É importante ter esse tipo de competência para não se trabalhar num silo de arquitetura, mas sim para entregar valor para o negócio. Ter essa sensibilidade e competência é fundamental nesta altura em que estamos a viver” Edgar Ivo, Red Hat: “As competências técnicas são fundamentais; disso não há dúvida nenhuma. É preciso ter agilidade de aprendizagem. É preciso ter consciência do impacto que se tem. E, ao mesmo tempo, saber comunicar o impacto que se está a ter, para além de ser crítico naquilo que se está a fazer. A IA está aí; é preciso saber identificar problemas e encontrar soluções criativas para as resolver” Como se pode transformar o novo quadro europeu, nomeadamente o Data Act, o NIS2 e o DORA, num acelerador de autonomia e não num travão burocrático? Edgar Ivo, Red Hat: “Isso já começou a ser feito por algumas organizações. Antes, as regulamentações eram uma coisa que tinha de ser lida e assumida. Agora, são trabalhadas para acompanhar o negócio. O tema da automação e dos processos são essenciais para aumentar a agilidade e responder às necessidades do negócio. Deve-se aproveitar estas regulamentações para justificar os orçamentos” Quais são as recomendações finais que dariam às empresas que estão a considerar adotar uma estratégia de cloud híbrida ou multicloud? Rodrigo Barone, Logicalis: “É preciso pensar na arquitetura e pensar nas componentes todas envolvidas numa determinada solução ou produto. A IA é um aliado para esse processo. Temos de estar sempre a aprender e a ser curiosos porque a IA pode-nos ajudar no dia a dia, mas cabe-nos a nós a curiosidade para agilizar e melhorar o nosso trabalho e o nosso produto final” Hugo Silva, Noesis: “Acho que na era da inteligência artificial é fundamental termos a parte do humanismo de volta. É uma máquina que está ali; temos de ter sentido crítico e não adotar aquilo como uma verdade absoluta. É preciso definir os objetivos do negócio da organização, se quero uma arquitetura ágil, inovadora, redundante… é preciso definir esses passos para definir as etapas de adoção” Edgar Ivo, Red Hat: “Este tema da cloud híbrida e multicloud está numa fase transitória. As organizações têm de perceber isso: vão precisar de várias clouds. É preciso começar e pensar a infraestrutura com essa mentalidade. Há coisas que vão ficar on-premises, outras na cloud. É preciso definir uma arquitetura de infraestrutura nómada que acompanhe o modelo operacional de suporte para tirar partido de todo o ecossistema que têm ao dispor” |