A inteligência artificial está na ordem do dia, mas, para que as organizações possam utilizar a tecnologia na melhor das suas capacidades, precisam que os seus dados estejam prontos para enfrentar a nova realidade. Devoteam, Logicalis, Noesis, Red Hat, Schneider Electric, Tungsten Automation, Vertiv e Visionware partilharam a sua visão sobre o mercado da inteligência artificial e dos dados em Portugal
Vivemos na era da Inteligência Artificial (IA); a tecnologia em questão deixou de ser ficção científica para se tornar parte integrante do quotidiano das pessoas e, principalmente, das organizações. Desde recomendações personalizadas até diagnósticos médicos assistidos por algoritmos, a IA está a transformar a forma como interagimos com a tecnologia e processamos informações. Por trás de cada sistema inteligente existe um elemento crucial e muitas vezes subestimado: os dados. Estes dados são o combustível que alimenta a revolução da inteligência artificial. Sem ele, os algoritmos mais sofisticados permanecem inertes, incapazes de aprenderem, de se adaptarem ou de tomarem decisões. Nesta mesa-redonda híbrida – com público presente no Fórum Tecnológico Lispolis e virtualmente para centenas de leitores –, a IT Insight contou com a presença da Devoteam, da Logicalis, da Noesis, da Red Hat, da Schneider Electric, da Tungsten Automation, da Vertiv e da Visionware para partilhar a sua visão sobre o mercado de IA e de dados. Como avaliam se uma empresa está pronta para IA ou se deve primeiro resolver problemas mais básicos de digitalização? Se tivessem de escolher apenas um caso de uso de IA para implementar primeiro numa empresa tradicional portuguesa, qual seria?
André Ribeiro, Data Center Field Sales Engineer, Schneider Electric: “As empresas começam a sentir essas necessidades e as que querem navegar e estar à frente do mercado têm obrigatoriamente de ir pela IA. Já existem dados organizados que trazem um outcome benéfico para a empresa. É preciso fazer uma avaliação da sua estratégia em conjunto com os objetivos da própria empresa para que, depois, a IA consiga atingir esse fim. Se existir uma higiene de dados é possível dar uma boa resposta e solução às organizações” João Diniz, Senior Sales Strategic Account Director, Tungsten Automation: “Vemos que existem muitas empresas que andam à procura dos use cases certos para implementar. Muita gente fala de inteligência artificial; todos os produtos têm IA integrada. É preciso perceber o que é que está a ser utilizado e para que fins; há produtos que não são mais que análise de dados, por exemplo. Com o desenvolvimento de novos algoritmos e a velocidade a que a inovação está a acontecer, a IA é uma tecnologia muito mais acessível para os utilizadores e organizações”
João Martins, Data Analytics & AI Senior Manager, Noesis: “Tudo depende do setor em que estamos a trabalhar. No PowerPoint tudo se pode transformar, mas se não formos diretamente ao problema da organização, não importa o PowerPoint. Não é possível entrar no mundo da IA generativa se não houver uma cultura. É preciso juntar a componente de IT – é impossível não estar envolvida – e a equipa de negócio – que tem de se sentir revista naquilo que está a ser proposto. Temos exemplos diferentes nas várias regiões, mas mais do que sermos nós a definir o use case, é mais importante ouvir a dor da própria organização” José Khouri, Data & AI Solutions Architect, Logicalis: “Não há use case pré-definido. O que vejo no mercado português é que trabalhamos muitos projetos de Indústria 4.0, como RPA com inteligência artificial. Um ponto muito importante é que o IT tem de estar envolvido – é essencial –, mas as áreas de negócio são quem detêm a informação e partilham os melhores use cases para a empresa. A área de produção talvez tenha use cases mais interessantes para a organização; depende de caso para caso. Todos os use cases podem ser corretos”
Pedro Martins, Executive Director & Head of Data & AI, Devoteam: “Do ponto de vista interno, os use cases mais utilizados são a utilização de um chatbot interno em toda a organização para dar informação em segundos ao utilizador, a informação que é da própria empresa. Do ponto de vista externo, o customer care é a área que, nos últimos anos, tem tido mais atenção, a forma como se relaciona com os clientes e recolhe todas as informações possíveis para ajudar o cliente. Acho que estamos no tipping point da utilização de agentes e todos os cloud providers estão a investir massivamente” Os casos de uso nesta área dependem de dados estruturados. Que percentagem de empresas está realmente preparada e já tem os dados suficientemente estruturados para projetos de inteligência artificial sérios? João Diniz, Tungsten Automation: “O que vemos é que existe uma quantidade de dados muito grande nas empresas, mas essa quantidade de dados não era explorada como deveria, também porque não havia tecnologia para as analisar. Agora, com a inteligência artificial, também podemos utilizar a tecnologia para analisar esses dados e tirar daí informações. A tecnologia, hoje, permite-nos extrair informação dos dados não estruturados. A qualidade dos dados é muito importante para dados utilizados nas decisões. É importante existir uma quantidade bastante extensa de dados” Que diferenças observam entre as empresas que falham e as que têm sucesso na implementação de IA? Qual o maior erro que veem as empresas portuguesas a cometer ao iniciar projetos de inteligência artificial?
Edgar Ivo, Territory Manager Portugal, Red Hat: “Este é um tema que não é simples de resolver. A maioria das iniciativas de IA nas organizações não chegam a bom porto; é preciso ter equipas multidisciplinares para aumentar a probabilidade de ter uma boa iniciativa com sucesso. É preciso ter uma boa qualidade de dados, mas também quantidade. Estive numa iniciativa que tinha uma boa qualidade de dados, mas eram poucos para ter uma iniciativa com sucesso” Mário Vasconcelos, Sales Enterprise Accounts Director Iberia, Vertiv: “Os dados, a governança e o fator humano são essencias, mas também a infraestrutura. A ambição do alinhamento da ambição tecnológica e a estrutura base são um imperativo. Não basta ter ideias inovadoras, mas também é preciso investir numa infraestrutura sólida, bom processamento de dados, energia fiável, rede segura e robusta. Todos estes sistemas – energia ou refrigeração, ou a infraestrutura em si – deve ser escalável. É na ambição que reside a inovação tecnológica”
Bruno Castro, Founder & CEO, Visionware: “Não implementamos soluções de IA e, na verdade, até podemos ser um travão à implementação da inteligência artificial nas organizações. Como auditores e security officers, temos de analisar os projetos de inovação – seja ou não com inteligência artificial. O que vejo nos clientes em vários setores e geografias é que há uma tendência de saltar para a IA porque o mercado está a pressionar. Também há uma visão futurística de que, se isto não salva, é a vacina mágica que vai resolver praticamente tudo” Pedro Martins, Devoteam: “Houve um excesso de expectativa no mercado de que a IA ia resolver tudo, e não foi bem assim. A IA pode ter – e tem – um impacto muito grande nas organizações em termos de eficiência, mas há um desalinhamento entre a estratégia de uma empresa ou grupo e a expectativa de que a IA vai resolver tudo, com quem vai implementar a solução na organização. Pergunta-se sempre sobre o retorno de investimento, mas, neste momento, não há maturidade na IA para se falar disso, não há dados históricos. Há sempre benefícios, mas o grande desafio é o desalinhamento de expectativas” José Khouri, Logicalis: “Há certas formas de fazer a medição do ROI, mas também há problemas de segurança. A questão da infraestrutura é essencial. As expectativas são muito altas, continuam a ser muito altas, e falamos cada vez mais com as PME. Há, no entanto, uma falta de dados que é bastante relevante porque a maioria das empresas não tem dados suficientes, principalmente se estivermos a falar de PME; essa é uma realidade real que sentimos junto dos clientes para implementar IA”
João Diniz, Tungsten Automation: “Temos de perceber que os projetos de inteligência artificial se integram nos projetos mais genéricos de implementação. No entanto, se calhar existem componentes que têm de ser mais pensadas. Na maioria dos projetos que vemos a acontecer tem de estar subjacente um ROI que se tem de conseguir medir de alguma maneira, mesmo que exista outros objetivos que são tangíveis. É possível avaliar as métricas e a qualidade da iniciativa” João Martins, Noesis: “As métricas de sucesso são completamente diferentes entre uma inteligência artificial tradicional ou IA generativa. O mundo da IA generativa tem o desafio de a forma como interpreta uma resposta é completamente diferente do que outra pessoa pode interpretar; perdemos a componente da objetividade. Tudo o que são respostas diretas são fáceis de medir; se forem respostas mais abertas é mais difícil de medir” Como é que se garante que a infraestrutura - do data center à cloud - acompanha as exigências dos projetos de IA em termos de capacidade, resiliência e sustentabilidade? Mário Vasconcelos, Vertiv: “A infraestrutura é a face oculta deste tema. Falamos de dados, de regulação, do nosso sentido humano e como reagíamos a toda esta abordagem, mas a infraestrutura é que suporta este desenvolvimento. Os projetos não existem só na cloud e no hyperscaler, mas também no edge e começamos a ver esses investimentos. A infraestrutura deve ser vista como um todo. A IA não passa só pela capacidade de armazenamento, mas também pela sustentação energética” André Ribeiro, Schneider Electric: “Os produtos têm de ser cada vez mais eficientes e resilientes e, alinhado a isso, tem de ter software com base em tecnologia de IA que depois permite otimizar a infraestrutura. Os data centers – quer corram sistemas de IA ou não – precisam de ter uma capacidade resiliente porque é o que assegura as operações das organizações. Cada bastidor de IA consome cada vez mais energia e existe uma preocupação cada vez maior pela sustentabilidade” Edgar Ivo, Red Hat: “Grande parte das conversas que temos tido com os clientes têm a ver com o suporte para que algo entre em produção. Uma boa parte das tecnologias que estão na inteligência artificial vêm do open source. Acreditamos que devemos ter modelos de inteligência artificial com menos parâmetros, mas que permitam ter a mesma qualidade, mesmo com um set de dados mais pequeno, que vai dar uma maior eficiência energética e do data center” Como justificam o investimento em IA aos conselhos de administração quando o ROI não é imediato? João Martins, Noesis: “Atacando a dor que o cliente tem e não tentar resolver tudo da mesma forma. Se dissermos que um projeto de IA custa ‘x’ e resolve inúmeros problemas, vamos ter um PowerPoint espetacular, mas não vai funcionar. Temos de explicar que se falharmos, falhamos rápido e temos capacidade de refazer, voltar a treinar e procurar novos casos de uso. Não podemos tentar utilizar a IA como a bala de prata para tudo” Pedro Martins, Devoteam: “Quando temos este tipo de reuniões olhamos para a indústria, para os use cases com maior impacto e benefício. Aterramos naquilo que é o setor da empresa e a empresa em si e definimos aquilo que consideramos serem os três silver bullets que podem ter um impacto estruturante nos seus processos e nas suas operações”
Mário Vasconcelos, Vertiv: “A defesa destes projetos junto dos stakeholders é importante. Temos de olhar para a IA como um investimento estratégico e não como um custo, porque é uma alavanca para a organização. Deve ser visto como um investimento com impacto a médio/longo prazo e devemos olhar para outros benefícios, como a otimização dos processos e da eficiência dos colaboradores, para além de relembrar o risco da inação e do ficar de fora desta onda de inovação” Edgar Ivo, Red Hat: “Um projeto de IA não é um projeto com início, meio e fim. É um caminho e é preciso explicar isso ao board, de preferência com quick wins. Esta área precisa de muita experimentação: temos de experimentar rápido, falhar rápido e adaptar. Temos de promover a partilha de casos de sucesso para que possamos apresentar esses casos ao board” André Ribeiro, Schneider Electric: “Os nossos produtos têm um ROI quase imediato e temos outra visão; os produtos provocam melhorias na eficiência e isso provoca um ROI imediato nas poupanças para a organização. O ROI pode ser tangível e intangível na parte monetária. No que respeita à intangibilidade, temos de ir para a parte da análise do cliente final e as melhorias que podem ser vistas, mas são difíceis de medir” Com a crescente integração da IA em processos críticos, como é que as empresas devem equilibrar inovação com cibersegurança, em especial face aos riscos de uso malicioso e exposição de dados?
José Khouri, Logicalis: “Todos os projetos que fazemos envolvem a área de cibersegurança e temos um assessment feito em termos de segurança. Mesmo que tenhamos diversas funcionalidades de segurança, é preciso ter em consideração o fator humano” Bruno Castro, Visionware: “A IA é essencial para a economia digital, mas não pode ser à custa da cibersegurança. As pessoas de segurança não querem complicar, mas sim que as soluções sejam robustas. Na pandemia tivemos de saltar para o digital e tivemos quase uma crise cibernética. Na adoção de IA vemos um contorno dos meios tradicionais de segurança. Temos de utilizar as melhores práticas de governança, até porque estamos a falar de dados sensíveis e pessoais. É preciso fazer testes, avaliar, reavaliar, envolver as equipas de desenvolvimento, avaliar regularmente… não é nada de novo” |