Um progresso de avanços e recuos

Para perceber a evolução das mulheres no setor tecnológico, a Kaspersky lançou a campanha Women in Tech, evidenciando que embora haja avanços, a jornada ainda é longa no plano da inclusão

Um progresso de avanços e recuos

Dois passos à frente, um passo atrás, avanços, recuos, altos e baixos. Assim se carateriza o percurso da igualdade de género no setor empresarial das IT. O tema é transversal e apesar de na tecnologia o panorama ser hoje mais promissor, continua a ser um território dominantemente ‘masculino’, por desbravar. Impulsionar a presença feminina nas várias indústrias é um desafio permanente e requer uma multiplicidade de mudanças estruturais, acima de tudo dependentes da sensibilização e consequente mudança de mentalidades. 

A discriminação com base no género é considerada um problema sistémico e é acompanhada por anos de fatores políticos, sociais, económicos e fundamentalmente históricos. O ranking do Instituto Europeu para a Igualdade de Género (EIGE), criado para reforçar e promover a igualdade de género na União Europeia, coloca Portugal na décima sexta posição entre os estados-membros, uma subida de quatros lugares na classificação desde 2010. 

Apesar de se manter abaixo da média europeia, regista avanços a um ritmo mais rápido do que outros estados-membros, nota Evgeniya Naumova (na fotografia à esquerda), Executive Vice President Corporate Business and Deputy Chief Business Development Officer, Commercial da Kaspersky, que encabeça a Women in Tech, campanha que pretende dar voz a mulheres portuguesas que trabalham em IT, "desmistificando preconceitos associados à profissão e encorajando mais jovens a ingressarem no mundo da tecnologia". Segundo Naumova, o projeto surge de um compromisso da Kaspersky de criar uma indústria mais “diversa e segura”, que através de testemunhos reais e em primeira mão, inspira mais mulheres a integrarem o setor. 

'It's a women's world'

Com esta ambição, a Kaspersky lançou três talks “informais” no YouTube, lideradas pela influencer de tecnologia Geek’alm, que se sentou à conversa com algumas referências femininas portuguesas a trabalhar em cargos de IT.  Nesse contexto, são partilhadas experiências de mulheres bem-sucedidas na área da tecnologia, com diferentes idades e perfis, que trabalham em empresas influentes a nível nacional – Accenture, Farfetch e Natixis. “Desmistificámos também o que fazem no seu dia a dia, em função do cargo que desempenham – o que, muitas vezes, é algo complexo para quem está de fora e pode criar algum distanciamento”, explica.

Evgeniya, que entrou na Kaspersky há mais de dez anos, dá o seu próprio exemplo como uma história de sucesso da igualdade em ambiente corporativo de IT. “Posso dizer que sou um exemplo de uma mulher que prosperou no mundo profissional, que progrediu e alcançou uma posição de liderança”. Como tal, ficou “muito feliz em poder liderar a campanha” que pretende mostrar que "tanto homens como mulheres devem poder seguir os seus sonhos e ambições de forma igualitária”.

Contudo, o problema está enraizado nas próprias fundações da sociedade e para evoluir, como em qualquer processo cultural disruptivo, são precisos anos para se verificarem diferenças. “No passado, não era culturalmente fácil aceitar – quanto mais incentivar - o facto de uma mulher querer trabalhar em áreas técnicas e associadas a tecnologia. Aliás, uma das nossas convidadas para a campanha, ao longo da conversa, afirmou que o pai achava que não fazia sentido ela seguir uma área relacionada com tecnologia. Queria que ela fosse para áreas mais ligadas a turismo ou culinária, em vez de seguir uma carreira em IT, que era o que a apaixonava”, disse Naumova em entrevista à IT Insight.

Balanço trabalho/vida pessoal

Contudo, a pandemia veio trazer novos desafios para o sexo feminino. O estudo que a Kaspersky desenvolveu a nível global – Women in Tech, Where are we now? Understanding the evolution of women in technology – indica que várias mulheres apreciaram a maior flexibilidade proporcionada pelo teletrabalho, pelo que conseguiram ser mais produtivas e autónomas, mas que simultaneamente a pandemia originou um desequilíbrio profundo entre o trabalho e a vida familiar.  

Questionadas sobre as funções quotidianas que prejudicavam a sua produtividade no trabalho, 60% afirmaram que tinham feito a maior parte da limpeza em casa, além de se verem sobrecarregadas com outras tarefas como trabalhos escolares. O estudo verificou também que foram as mulheres que realizaram o maior esforço para adaptar os seus horários para cuidar da família. Adicionalmente, 47% das inquiridas afirmaram que os efeitos da COVID-19 atrasaram a sua evolução na carreira, apesar de uma percentagem semelhante (46%) acreditar que a igualdade de género é mais provável de ser alcançada através de estruturas de trabalho remoto. 

Mas, segundo Naumova, as reações à pandemia são singulares e não dependem, necessariamente, do género – variam de mulher para mulher: “algumas apreciam a maior flexibilidade e a inexistência de deslocações trabalho-casa, enquanto outras estão, literalmente, à beira de um esgotamento”, reitera. Nesse sentido, é fundamental que as empresas assegurem estratégias de “apoio aos colaboradores que têm responsabilidades de prestação de cuidados e que ressalvem, tanto através da cultura como da política empresarial, que darão aos pais, trabalhadores de ambos os sexos, a flexibilidade de que necessitam para trabalhar durante e além da pandemia”.

Encontrar um caminho para a progressão

Os parâmetros de contratação podem variar de empresa para empresa. “Havendo parâmetros de contratação diferentes para homens e mulheres, já estamos a assumir que um é mais capaz que o outro para a posição ou tarefa em causa. Esta é uma visão que a Kaspersky procura combater e desmitificar, pois acreditamos que os candidatos devem ser avaliados apenas pelas suas competências profissionais”. Naumova explica, ainda, que “contamos com cada vez mais legislação, mesmo a nível europeu, acerca da igualdade e equidade de género”

Muitas empresas implementam quotas, frequentemente definidas por políticas externas, “concebidas para aumentar a probabilidade de os comportamentos virem a ser alterados e para permitir que mais mulheres alcancem cargos seniores”, mas que, na realidade, podem não ter qualquer efeito no cerne da problemática. Contudo e apesar da perceção da representação de género no setor corporativo avançar num caminho positivo, os dados da Kaspersky indicam que a falta de profissionais femininas na indústria tecnológica faz 38% das mulheres recear entrar no setor.

Na área das IT, “os preconceitos de que as mulheres não têm competências para cargos técnicos, continuam ainda a fazer-se ouvir e sentir” e o “desafio está muito mais ligado à mudança de mentalidades em geral, do que a medidas como são exemplo as quotas”, mas “há que ressalvar que as quotas não são, nem podem ser, a única forma de assegurar o progresso para as mulheres em tecnologia”.

Women in Tech será “o presente e o futuro”

O equilíbrio proporcionado por uma equipa diversa é “sinónimo de beneficiar de uma gama muito mais vasta de mentes criativas, diferentes contextos e universos, bem como várias experiências de vida” e  deve ser assegurado por uma contratação com base nas capacidades do colaborador, que não depende apenas do colmatar de números. “Para uma indústria que necessita constantemente de inovar e ser disruptiva, faz sentido beneficiar do maior número de perspetivas possíveis” e “as equipas constituídas por homens e mulheres são as mais eficientes e harmoniosas, e a indústria tecnológica só tem a beneficiar com uma representação igualitária”. 

Como tal, devem ser implementadas “medidas-chave e iniciativas que apoiem verdadeiramente a carreira das mulheres na área tecnológica” o que passa, por exemplo, pela oferta de programas de aconselhamento ou estágios que proporcionem o acesso a oportunidades e experiência. A Kaspersky desenvolveu um projeto para apoiar mulheres ligadas à cibersegurança através de um programa de estágio global remunerado – o SafeBoard – que se encontra atualmente disponível na Rússia, Europa e países da APAC. Além disso, “pusemos em prática uma comunidade na Internet chamada Women in CyberSecurity”. Acima de tudo, a igualdade depende da proatividade e empenho das empresas de IT e dos seus colaboradores masculinos em assegurar a progressão das mulheres e das suas carreiras. Os gestores devem proporcionar as condições certas para as suas competências e estar atentos à sua experiência. 

É de ressalvar que não é apenas na problemática da igualdade de género que a discriminação é evidenciada no setor tecnológico. Se a nível de igualdade de género já se percorreu um longo percurso que, contudo, ainda não foi concretizado a 100%, o cenário para pessoas que não se identificam com o binário, trans, de minorias étnicas, entre muitas outras que são diariamente vítimas de atitudes discriminatórias, o percurso é infindável. Da experiência de Evgenya, "muitas empresas implementam hoje programas relacionados com estas temáticas e esse trabalho traz mudanças reais".

Evgeniya Naumova conclui, ressalvando que a campanha “pretende ser intemporal e além-fronteiras”, concebida para se manter “dinâmica, através de novos estudos e da partilha de mais exemplos femininos, continuando a apoiar e a inspirar jovens mulheres a seguir a área das tecnologias, e mantendo o setor ciente dos principais flagelos e desafios ao nível do género”. Para tal, “esperamos que a ‘Women in Tech’ – mulheres em tecnologia – se torne o presente e o futuro” do setor das IT. 

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