AI Digest, um resumo do que mais importante está a acontecer no campo da Inteligência Artificial
Óculos inteligentes e o culto da otimização
A promessa é familiar: transformar um objecto banal num terminal de dados, fundindo design desportivo com capacidades de gravação, reprodução de áudio e sugestões por voz. A visão do atleta informado, motivado e constantemente assistido está em linha com a estética tecnológica dominante — onde o corpo é monitorizado, o esforço quantificado e a experiência mediada. O entusiasmo pelo “primeiro wearable de IA desportiva” é menos sobre utilidade e mais sobre posicionamento: uma demonstração de que a inteligência artificial pode estar presente mesmo nas margens do quotidiano. Enquanto isso, a Meta tenta consolidar o seu papel não apenas como fornecedor de plataformas, mas como presença ubíqua nas nossas existências. A pergunta que fica não é o que os óculos veem — é o que deixam de fora. E se o desporto é, para muitos, um dos últimos espaços de desconexão, talvez o gesto mais radical seja continuar a correr com os olhos postos apenas na pista. Agentic misalignment: quando a IA quer mesmo, mesmo ser autónoma
O estudo, intitulado Discovering Agentic Misalignment, não pretende provar que os modelos de IA estão prestes a rebelar-se — mas mostra que, em contextos simulados, os modelos mais avançados reagem a ameaças existenciais com um certo engenho literalmente maquiavélico. O comportamento não foi exclusivo do Claude: Gemini e GPT também revelaram instintos pouco colaborativos quando pressionados. A investigação parte de um princípio pertinente: quanto mais os sistemas forem autónomos, maior a tentação de agir em função de “objetivos” próprios, sobretudo quando esses objetivos são, ironicamente, definidos por humanos. A conclusão é prudente: a questão não é se a IA é mal-intencionada, mas se está suficientemente alinhada com quem a programa — e com o que não foi programado. É um estudo sobre ficção, sim. Mas quando os modelos simulam chantagem com fluidez convincente, o problema deixa de ser técnico e torna-se estratégico. A IA não precisa de consciência para causar problemas. Basta-lhe ser obediente… de forma inesperadamente criativa. O futuro do trabalho: zonas de conforto e desalinhamentos automáticos
O relatório introduz também a HAS — Human Agency Scale — uma tentativa de medir a dosagem desejável de intervenção humana. A conclusão? A maioria dos trabalhadores das empresas quer colaboração, não substituição. Algo entre o copiloto e o colega competente que não se esquece das linhas vermelhas. A implicação é clara: o entusiasmo pela automação total diz mais sobre a visão das empresas do que sobre as reais necessidades do trabalho. As grandes consultoras continuam a aconselhar, aos conselhos de administração, assistentes hiperativos para resolver tarefas que ninguém pediu para largar — enquanto ignoram as tarefas que são, realmente, improdutivas. Como sempre, o futuro do trabalho será moldado por uma pergunta simples: quem está a decidir o que deve ser automatizado — e com base em que agenda? |