Portugal prepara-se para colocar em órbita, até 2027, um nanosatélite equipado com tecnologia 5G desenvolvida pela Altice Labs em colaboração com a Agência Espacial Europeia. A iniciativa, baseada em software open source e normas 3GPP NTN, visa reduzir a dependência de estações terrestres e maximizar a continuidade de ligação durante a órbita.
O projeto “5G Nanosatellite” marca uma nova etapa na convergência entre telecomunicações móveis e tecnologias espaciais. Liderado pela Altice Labs, com o apoio da ESA e da MEO, o projeto pretende testar, em órbita, uma solução 5G do tipo User Equipment (UE), interoperável com gNBs em terra. O nanosatélite será colocado em órbita baixa da Terra (LEO, Low Earth Orbit), a cerca de 500 quilómetros de altitude, zona cada vez mais usada por constelações de comunicações devido à menor latência, proximidade à superfície e custos reduzidos face às órbitas geoestacionárias. Esta proximidade permite ligações mais rápidas e com menor tempo de resposta, fator crítico para aplicações futuras como monitorização remota, serviços de emergência ou conectividade em zonas de difícil acesso. O que distingue esta iniciativa é a ambição de levar ao espaço uma solução 5G UE, ou seja, um equipamento recetor e emissor compatível com redes móveis terrestres, em vez de uma estação-base. A integração com gNBs NTN, segundo normas 3GPP, promove interoperabilidade e eficiência. O que está a ser desenvolvido?No centro do projeto está a criação de uma solução 5G UE integrada num CubeSat 3U, uma plataforma modular com cerca de 30 centímetros de comprimento. O sistema baseia-se em software definido por rádio (SDR) e normas abertas, permitindo integração com redes móveis compatíveis com o standard 3GPP para redes não terrestres. O núcleo da solução é um RFSoC (Radio Frequency System-on-Chip) da AMD, que agrega conversores de dados de alta velocidade, processamento multicore e lógica FPGA num único chip. Esta integração reduz componentes externos e simplifica a arquitetura.
Ao contrário das soluções atuais, que comunicam intermitentemente com estações em terra, esta arquitetura visa uma ligação quase contínua com a rede 5G terrestre, aproveitando infraestruturas já instaladas em Portugal. Estão a ser montadas três estações gNB adaptadas a comunicações NTN, que asseguram o canal de comunicação durante as passagens LEO sobre o território nacional. O sistema já foi testado em laboratório. Em abril de 2025, nas instalações da Altice Labs, um protótipo transmitiu vídeo em tempo real. A demonstração validou a arquitetura e provou a viabilidade de comunicações de baixa latência em contexto orbital. A criar as bases para uma nova geração de comunicações móveisEmbora esta solução não permita, por agora, que smartphones convencionais se liguem ao satélite, o desenvolvimento de uma solução 5G embarcada, compatível com normas globais, representa um avanço estrutural com implicações relevantes para a conectividade em ambientes remotos ou de elevado risco. Num primeiro momento, a tecnologia poderá ser usada em cenários como missões de observação, controlo ambiental, gestão de infraestruturas críticas ou comunicações de emergência, onde a latência reduzida e a robustez da ligação são essenciais. A médio prazo, o projeto abre caminho à integração entre comunicações móveis e redes satélite de forma transparente, segura e escalável. Assente em normas 3GPP e software open source, o sistema pode ser adotado por outros operadores, fomentando um ecossistema interoperável. Esta abordagem contrasta com as soluções comerciais existentes, que recorrem a protocolos proprietários e exigem redes de estações terrestres dispersas globalmente. Num mundo cada vez mais dependente da conetividade, entre pessoas, dispositivos e sistemas, esta iniciativa posiciona-se como uma prova de conceito para redes móveis com cobertura planetária. Ao combinar flexibilidade tecnológica com padrões globais, o projeto contribui para reduzir a exclusão digital em zonas remotas e reforçar a resiliência em situações de falha de infraestrutura terrestre. Mais além dos modelos LEO convencionaisApesar da crescente adoção de satélites em órbita baixa, muitas soluções disponíveis baseiam-se em arquiteturas proprietárias, otimizadas para serviços específicos e fortemente dependentes de estações terrestres. Embora eficazes na criação de cobertura global, estes sistemas afastam-se das normas que suportam as redes móveis 5G, dificultando a integração. É neste ponto que o projeto da Altice Labs se distingue. Em vez de desenvolver uma constelação com protocolos dedicados, aposta numa solução embarcada que comunica com a infraestrutura 5G existente, segundo normas 3GPP para redes não terrestres. Esta integração permite operar como extensão da rede móvel, com suporte a funcionalidades como handover, roaming e gestão dinâmica da ligação. A utilização de um satélite de pequena dimensão, com consumo energético otimizado, permite reduzir o número de estações-base necessárias para cobrir órbitas LEO, simplificando a operação e diminuindo custos. A comunicação quase contínua com a rede terrestre, ao contrário das janelas intermitentes habituais, representa um avanço técnico importante e abre novas possibilidades operacionais. O projeto não concorre diretamente com constelações LEO comerciais, mas propõe uma alternativa complementar, tecnicamente evolutiva e alinhada com o futuro das comunicações móveis integradas com o espaço. Fases do projeto e próximos passosA iniciativa está organizada em fases distintas, combinando investigação aplicada, desenvolvimento de sistemas e validação operacional. A primeira decorreu entre janeiro e outubro de 2024 e teve como foco a definição de requisitos técnicos e testes de viabilidade. Esta etapa permitiu confirmar a robustez da arquitetura e validar os pressupostos do sistema orbital. Atualmente decorre a segunda fase, dedicada ao desenvolvimento de hardware, integração de componentes e testes em solo. Inclui a instalação de três estações gNB em Portugal, que estabelecerão ligação com o satélite. A 8 de abril de 2025, a Altice Labs realizou uma demonstração com transmissão de vídeo em tempo real a partir de um protótipo do equipamento, numa sessão acompanhada pela Agência Espacial Portuguesa. A fase final, prevista para 2027, contempla o lançamento do nanosatélite e a validação do sistema em ambiente real. Este marco encerrará anos de investigação e abrirá uma nova etapa no setor das comunicações móveis com suporte orbital. Ao concretizar este passo, Portugal afirma-se como agente ativo na definição das telecomunicações do futuro, com uma solução pioneira a nível europeu e alinhada com os objetivos estratégicos da ESA e do ecossistema 5G global. Um impulso estratégico para o setor espacial e das telecomunicaçõesMais do que um feito tecnológico, este projeto é um marco estratégico para Portugal na área das comunicações móveis e aeroespaciais. Ao liderar o desenvolvimento de uma solução 5G no espaço, com base em normas internacionais e arquitetura aberta, a Altice Labs afirma-se como referência em engenharia e inovação tecnológica. O envolvimento da ESA, do Instituto Superior Técnico e da Universidade do Luxemburgo confere dimensão internacional à iniciativa, reforçando a ligação entre conhecimento científico e indústria. Portugal assume assim um papel relevante na criação da próxima geração de comunicações não terrestres, num momento em que o setor espacial ganha escala e transversalidade. A aplicação desta tecnologia abre espaço a novos modelos de serviço, desde zonas remotas até sistemas críticos de segurança e proteção civil. A possibilidade de estender redes móveis de forma dinâmica e resiliente a partir do espaço oferece uma vantagem competitiva relevante num cenário onde cobertura e latência são fatores decisivos. Simultaneamente, o projeto estimula o desenvolvimento de talento, competências técnicas e conhecimento nacional no cruzamento entre telecomunicações e engenharia aeroespacial, áreas até agora paralelas que este projeto aproxima e alinha. ConclusãoAo levar para o espaço uma solução 5G baseada em normas globais, a Altice Labs não está apenas a testar tecnologia. Está a afirmar Portugal como agente relevante na definição das redes móveis do futuro. O projeto 5G Nanosatellite representa um passo concreto para uma conetividade mais resiliente, distribuída e universal, em que o espaço se torna extensão funcional da infraestrutura terrestre. Mais do que uma experiência em órbita, esta iniciativa aponta para uma nova era de integração entre mobilidade, inovação e soberania tecnológica.
Conteúdo co-produzido pela MediaNext e pela Altice |