Chegou a hora de assumir que a qualidade não é opcional

Chegou a hora de assumir que a qualidade não é opcional

Vivemos num ecossistema digital que avança a um ritmo superior à capacidade de adaptação de muitas organizações

Se antes falar em “qualidade” significava apenas ausência de erros, hoje significa algo (muito) maior: um ativo estratégico que define a relevância e a sustentabilidade de uma empresa no mercado. Persistir em tratá-la como uma questão meramente técnica é, atualmente, uma das maiores ameaças à verdadeira transformação digital.

O mais recente "InfoBrief" da IDC, revela uma realidade desconfortável que afeta muitas empresas europeias: enquanto algumas organizações aceleram a sua transformação, explorando ferramentas como a Automação e a Inteligência Artificial (IA), outras permanecem estagnadas, “aprisionadas” em estruturas e práticas do século passado.

O problema não é a tecnologia, é a organização

É sintomático que 64% das empresas europeias demorem três semanas a executar um change request no seu software e que menos de 10% possuam capacidades de quality engineering unificadas. Atualmente, mais de metade do tempo das equipas de desenvolvimento é gasto em tarefas de manutenção do software ou em integrações entre sistemas, em vez de inovação e desenvolvimento de novas funcionalidades, por exemplo. Este cenário tem um impacto direto e imediato no negócio e na eficiência da organização. Processos lentos, comunicação fragmentada e falta de padronização resultam em produtos e serviços inconsistentes, muitas vezes incapazes de corresponder às expectativas do cliente. 

A qualidade não é um detalhe ou um luxo, é o reflexo da organização. Quando as equipas estão sobrecarregadas ou mal estruturadas, os erros multiplicam-se e a excelência desaparece.

A solução não passa por mais tecnologia, mas por reorganizar a forma como ela é utilizada. É preciso adotar práticas de DevOps e Platform Engineering que reduzam a fragmentação, criem pipelines de integração e entrega contínua, que automatizem a qualidade desde o primeiro momento. 

A obsessão pela velocidade produz sistemas frágeis

Durante anos, o mercado pressionou as organizações a acelerar o ritmo de desenvolvimento e de entrega de software, muitas vezes sem questionar a direção estratégica dessas iniciativas. A pressa, quando não sustentada por práticas robustas de quality assurance desde a conceção, resulta em complexidade crescente, acumulação de dívida técnica e elevados níveis de frustração, quer nas equipas internas, quer nos utilizadores finais. Sistemas desenvolvidos de forma inconsistente tendem a ser frágeis, de difícil manutenção e com baixa capacidade de evolução sustentável.

O referido estudo da IDC confirma aquilo que muitos já suspeitavam: organizações que incorporam a qualidade como princípio orientador desde a fase de conceção dos sistemas, registam ganhos superiores em produtividade, inovação e resiliência operacional. A solução não está em abrandar a velocidade, mas em sustentá-la com processos e boas práticas. Isso implica desenhar arquiteturas modulares que permitam evoluir sem comprometer a estabilidade, investir em testes automatizados que acompanhem todo o ciclo de desenvolvimento, adotar práticas de integração e entrega contínuas e garantir que as métricas de qualidade são monitorizadas em tempo real. Só assim a velocidade deixa de ser um risco para se tornar numa vantagem competitiva sustentável.

Automação e IA: não há atalhos para a maturidade

Muitos veem na automação e na Inteligência Artificial o próximo salto quântico da produtividade, mas tendem a esquecer-se de que estas tecnologias apenas amplificam o que já existe: se os processos forem caóticos, a IA será um multiplicador do caos; se forem consistentes e orientados para a qualidade, podem desbloquear ganhos reais. O relatório da IDC confirma esta realidade ao mostrar que 63% das organizações ainda têm baixos níveis de automatização e que, mesmo entre as que já exploram IA, persistem falhas estruturais, ausência de dados e testes de qualidade, falta de integração com ferramentas existentes e resistência cultural à mudança. 

Mais do que adotar tecnologia, é essencial criar uma cultura de maturidade digital, em que cada automação e cada aplicação de IA estejam alinhadas com objetivos claros de negócio, suportadas por processos auditáveis e orientadas para a melhoria contínua.

Platform Engineering: não é buzzword, é necessidade

A fragmentação tecnológica continua a ser um dos maiores entraves à qualidade e à velocidade de entrega nas organizações. A abordagem de Platform Engineering surge como resposta concreta a este desafio. Não se trata de mais uma metodologia para engrossar a lista de tendências, mas de uma mudança de modelo que coloca a engenharia ao serviço da criação de plataformas internas robustas, reutilizáveis e escaláveis.

Desenvolver plataformas internas centralizadas permite consolidar serviços e recursos essenciais, promovendo consistência, integração e reutilização. APIs e componentes padronizados, pipelines de testes automatizados e monitorização contínua da qualidade libertam as equipas de tarefas repetitivas, permitindo-lhes concentrar-se na criação de valor. Com ferramentas confiáveis e sistemas interoperáveis, o Platform Engineering acelera a entrega, eleva os padrões de qualidade e transforma a inovação numa prática previsível e sustentável.

A qualidade em escala não é um objetivo, é a forma como as organizações modernas sobrevivem e crescem. Não se trata de acelerar mais, mas de estruturar melhor: integrar processos sólidos, automatizar com inteligência e construir plataformas internas que permitam inovação previsível. Quem continuar a encarar a qualidade como detalhe final do desenvolvimento estará a comprometer a produtividade, a inovação e a própria relevância no mercado.

Escalar qualidade é, acima de tudo, ampliar confiança, fortalecer resiliência e garantir crescimento sustentável.

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